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Artigo Original

Inclusão de crianças com deficiência mental na escola comum. Visão crítica do modelo atual
Inclusion of children with mental deficiency in the common school: a critical vision of the present model
Paulo Breno Noronha Liberalesso
Médico. Departamento de Neuropediatria do Hospital Pequeno Príncipe, Curitiba, PR. Pós-graduação em Epileptologia. Mestrado em Neurociências. Doutorado em Distúrbios da Comunicação Humana.
Bianca Simone Zeigelboim
Fonoaudióloga. Mestrado, doutorado e pós-doutorado em Distúrbios da Comunicação Humana (UNIFESP). Coordenadora do Programa de Pós-graduação em Distúrbios da Comunicação da Universidade Tuiuti do Paraná.
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Pediatria Moderna Fev 12 V 48 N 2
Unitermos: deficiência mental, educação.
Unterms: mental retardation, education.

Numeração de páginas na revista impressa: 42 à 46

Resumo

A deficiência mental é uma das doenças neurológicas mais frequentes na população pediátrica. Embora descrita há milhares de anos, muitos aspectos neurobiológicos da deficiência mental permanecem desconhecidos. O modelo educacional mais adequado para essas crianças permanece em discussão e em constante evolução. Este artigo tem como objetivo destacar os principais aspectos históricos da deficiência mental e a evolução das diretrizes sobre inclusão de crianças especiais nas escolas comuns.

Introdução

A deficiência mental (DM) se encontra entre os transtornos neurológicos mais frequentemente observados na população pediátrica, com prevalência variando entre 1% e 3%(1). A elevada frequência de mutações em genes localizados no cromossomo X explica sua maior incidência no sexo masculino(2).

Há clara associação entre fatores de risco para DM e condição socioeconômica, de modo que países subdesenvolvidos e em desenvolvimento apresentam prevalência significativamente maior que países desenvolvidos. Entre os principais fatores de risco para DM e atraso do desenvolvimento neuropsicomotor se destacam: a) causas pré-natais (desnutrição materna, má assistência à gestante, doenças infecciosas e venéreas maternas, uso e abuso de drogas lícitas e ilícitas durante a gestação, poluição ambiental e alterações cromossômicas); b) causas perinatais (má assistência ao trabalho de parto, asfixia e traumatismos de parto, baixo peso ao nascimento, prematuridade e encefalopatia bilirrubínica); e c) causas pós-natais (desnutrição crônica severa, infecções do sistema nervoso central, intoxicações exógenas por medicamentos, inseticidas, chumbo e mercúrio e traumatismos cranianos). A análise desses fatores de risco torna clara a relação direta entre DM e carência social, econômica e cultural(3).

De acordo com a Associação Americana de Psiquiatria, o diagnóstico de DM deve ser embasado nos seguintes critérios: a) quociente de inteligência (QI), aferido por meio de testes e avaliações padronizadas, significativamente inferior à média esperada para a idade, refletindo valor igual ou menor que 70; b) deficiência em pelo menos duas das seguintes habilidades: autocuidados, comunicação, relacionamentos sociais, rendimento escolar/acadêmico, habilidades de lazer, trabalho, saúde e segurança; e c) início dos sinais e sintomas antes dos 18 anos de idade(4).

A aferição do QI deve ser baseada em aspectos clínico-comportamentais e psicométricos, de modo que, sem a utilização de testes padronizados, o diagnóstico de DM deve ser considerado provisório ou presuntivo. O conceito teórico de QI baseia-se na divisão da idade mental pela idade cronológica, sendo a primeira definida como a idade em que a média das crianças mentalmente normais é capaz de realizar determinadas tarefas ou atividades. Avaliações clínicas para determinação de QI devem ser realizadas, necessariamente, por psicólogos experientes em testes psicométricos formais. Embora a maior parte dos testes psicométricos seja objetiva, permitindo pouca variação na interpretação do examinador, a experiência do profissional é quesito fundamental no momento da análise e validação dos resultados. Estabelecendo o QI médio em 100 pontos e o desvio padrão (DP) em 15 pontos, define-se como deficiente mental o indivíduo com pontuação inferior a dois desvios padrões.

A palavra inteligência deriva do termo latino intellectus, sugerindo a capacidade inata dos seres humanos para entender e aprender. Embora se reconheçam definições distintas, inteligência pode ser entendida como a capacidade mental para identificar situações-problema, raciocinar, avaliar as possibilidades de solução, julgar a mais adequada e aprender com novas experiências. Do ponto de vista prático, as principais formas de inteligência são a conceitual ou acadêmica (refletindo a capacidade de resolver problemas intelectuais, utilização da linguagem de expressão e percepção, incluindo noções de QI), a inteligência prática (capacidade de executar as atividades da vida diária e os autocuidados) e a inteligência social (capacidade de compreender e manejar atividades sociais cotidianas, incluindo as relações interpessoais).

Fundamentos históricos da DM

Na Grécia Antiga (1600 – 1100 a.C.), período que antecedeu ao Império Romano, deficientes mentais eram considerados criaturas sub-humanas sendo, muitas vezes, lançados de elevadas estruturas arquitetônicas para a morte. Esse pensamento era compatível com os ideais de perfeição e beleza vigentes à época(5).

Durante o Império Romano (500 – 27 a.C.), a capacidade de falar era considerada apanágio para obter o direito de ser cidadão, de modo que os deficientes mentais, mudos e surdos-mudos não cumpriam os quesitos mínimos para serem cidadãos romanos. Por essa ocasião, muitas crianças com DM, habitualmente conhecidas como “lunáticas”, foram afogadas no rio Tibre. A crença de que a alma somente se manifestava por meio da linguagem falada se arrastou até meados da Idade Média (476 d.C. – 1453 d.C.), quando a capacidade de falar corretamente era considerada um critério filosófico para definir o Ser Humano. Na segunda metade da Idade Média os teóricos e religiosos passaram a crer que a alma também poderia expressar-se por intermédio de gestos, sinais e pequenos ruídos(5).

Na Idade Média a religião tinha os deficientes físicos, sensoriais ou mentais como tomados por forças do mal ou possessões demoníacas. Gradativamente, a doutrina cristã passa a adotar preceitos de caridade e misericórdia, ampliando o direito à sobrevivência desses indivíduos, incutindo na sociedade a ideia de que eles estariam, de alguma forma, sob uma proteção especial de Deus. Por essa ocasião, Santa Dinfna de Gheel, festejada no dia 15 de maio, torna-se padroeira dos deficientes mentais e doentes psiquiátricos. Na segunda metade da Idade Média proliferam na Europa instituições denominadas “asilos”, onde deficientes mentais, físicos e surdos-mudos se misturam aos mendigos, andarilhos, velhos abandonados, doentes contagiosos, prostitutas e delinquentes de modo geral. Talvez seu maior ícone, o Pitié-Salpêtrière, criado no século XVII para ser uma fábrica e armazém de pólvora, chegou a abrigar mais de oito mil indivíduos(5).

A diferenciação entre DM e doença mental ocorreria somente em meados do século XIX, na França, quando os psiquiatras Jean-Étienne Dominique Esquirol (1772-1840) e Philippe Pinel (1745 e 1826) demonstraram que a deficiência cognitiva apresentava caráter constante e pouco variável, enquanto a doença mental poderia ser transitória. O tratamento clínico de uma criança com DM pelo médico francês Jean-Marc-Gaspard Itard (1774-1838) demonstrou aos teóricos da época que o acompanhamento médico e pedagógico dessas crianças era possível.

Embora esses relatos históricos pareçam remotos e distantes de nossa realidade, até bem pouco tempo, em comunidades indígenas isoladas, havia a prática do abandono de crianças nascidas com deficiências físicas. As primeiras escolas destinadas ao atendimento de deficientes mentais surgiram no início do século XIX, na Europa, sempre afastadas dos grandes centros urbanos, pois naquela época se acreditava que a tranquilidade, o silêncio e principalmente o ar puro seriam fundamentais para a “recuperação” dos deficientes.

Sem dúvida, o surgimento da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE), no Brasil, representou um marco histórico para o cuidado e educação dos deficientes mentais. A primeira APAE se instala no Rio de Janeiro, em 11 de dezembro de 1954, por ocasião da chegada da senhora Beatrice Bemis, membro do corpo diplomático norte-americano e mãe de uma menina com síndrome de Down. O movimento rapidamente se expandiu e no ano seguinte (1955) era fundada a APAE de Brusque, em Santa Catarina, e em 1956 a APAE de Volta Redonda, no Estado do Rio de Janeiro. Com o movimento ganhando amplitude nacional, em 1962 é fundada a Federação Nacional das APAEs, constituindo uma sociedade civil de caráter filantrópico, com objetivos culturais, assistenciais e pedagógicos(6).

Outro marco igualmente importante na história da luta pela educação dos deficientes mentais no Brasil é a inauguração da Fundação “A Voz do Povo”, em 1959, uma entidade com o objetivo de acolher indigentes e idosos desamparados. Por sua forte oposição à ditadura militar, o idealizador desta Fundação, o deputado e radialista paranaense Jorge Miguel Nassar, vê-se obrigado a transferir a coordenação da instituição para seu amigo Justino Alves Pereira. O dr. Justino, juntamente com sua esposa Ildeman Pereira e mais sete mães de crianças especiais de Curitiba, funda a Associação Ecumênica de Proteção ao Excepcional, para acompanhar crianças com mais de oito anos, haja vista que naquela época as APAEs atendiam somente crianças até essa idade(7).

Aplicabilidade prática da classificação da DM

A primeira classificação da DM data de 1877, tendo sido criada por William Wetherspoon Ireland que, com base no que ele acreditava ser a causa primária dessa doença, estabeleceu dez formas principais: idiopática, microcefálica, eclâmptica, epilética, hidrocefálica, paralítica, cretinismo, traumática, inflamatória e por privação de dois ou mais sentidos. Nesse mesmo período, o médico inglês John Langdon Haydon Down tenta estabelecer uma classificação para a DM baseada em aspectos étnicos. Estudando uma série de crianças com características fenotípicas semelhantes, Down acaba por descrever a “idiotia mongoloide”, síndrome que anos mais tarde (1965), receberia seu nome. O termo “mongolismo” derivou da crença de que um indivíduo europeu, adquirindo determinada doença, poderia passar a apresentar características fenotípicas asiáticas, semelhantes às do povo da Mongólia.

Segundo a Organização Mundial da Saúde, considerando o grau de comprometimento cognitivo, a DM pode ser classificada em: a) leve – QI entre 50 e 69 – nível cognitivo de operações concretas de Piaget – idade mental estimada entre 7 e 12 anos; b) moderada – QI entre 35 e 49 – nível pré-operativo de Piaget – idade mental estimada entre 2 e 7 anos; c) severa – QI entre 20 e 34 – período sensório-motriz de Piaget – idade mental estimada entre 0 e 3 anos; e d) profunda – QI inferior a 20 – período sensório-motriz de Piaget – idade mental estimada abaixo de 2 anos(8,9).

Embora em desuso, muitos profissionais utilizam uma classificação segundo aspectos cognitivos e funcionais: a) dependentes – QI inferior a 25, havendo pouca progressão neurológica com a estimulação e com o tempo; b) treináveis – QI entre 25 e 75, podendo essas crianças adquirir hábitos de disciplina, domínio das atividades de vida diária e, com metodologia adequada, alguns poderão ser alfabetizados; e c) educáveis ou limítrofes – QI entre 76 e 89, podendo permanecer em escolas comuns, desde que com apoio psicopedagógico.

Outra classificação bastante útil, porém menos utilizada, divide os portadores de DM, segundo a intensidade dos apoios necessários: a) intermitente – a necessidade de apoio é episódica e de curta duração; b) limitado – a necessidade de apoio também é limitada, mas com duração contínua por um espaço de tempo; c) extenso – a necessidade de apoio é geralmente diária, não havendo limitação no tempo; e d) generalizado – a necessidade de apoio é constante, em praticamente todas as atividades de vida diária, não havendo nenhuma limitação no tempo.

Do ponto de vista prático, os alunos portadores de necessidades especiais podem ser classificados em: a) excepcionais intelectuais (superdotados e deficientes mentais – grau leve, moderado, severo e profundo); b) excepcionais por desvios físicos (deficientes físicos não sensoriais e deficientes físicos sensoriais – auditivos e visuais); c) excepcionais psicossociais (alunos com distúrbios emocionais e com desajustes sociais); e d) excepcionalidade múltipla (alunos com associação de mais de uma das formas descritas)(10).

A classificação da criança/aluno portador de necessidades especiais se torna importante durante a seleção dos recursos pedagógicos a serem utilizados em cada caso. Os recursos mais frequentemente utilizados são: a) ensino itinerante – professor especializado visita e orienta alunos e professores em uma série de escolas comuns; b) sala de recursos – ambiente com materiais especiais para que o professor especializado auxilie o desenvolvimento pedagógico de alunos dentro das escolas comuns; c) classe especial – ambiente destinado a alunos com DM leve, no qual o professor especializado deve recuperar pedagogicamente o aluno, visando o retorno para a classe comum; e d) escola especial – ambiente distinto da escola comum, destinado ao atendimento clínico e pedagógico de crianças e adolescentes com DM nos graus moderado, severo e profundo(10).

Perspectiva histórica da inclusão escolar

Na sociedade contemporânea há três “modelos” de inclusão educacional. Em países como a Irlanda, as crianças com necessidades especiais recebem orientação pedagógica em instituições especializadas, distintas da escola comum. Na Itália essas mesmas crianças se encontram, predominantemente, dentro das escolas comuns. No terceiro modelo, adotado até o momento pelo Brasil, pode-se encontrar crianças especiais tanto nas escolas comuns como nas escolas de educação especializada, com base, principalmente, no grau de comprometimento cognitivo.

Mesmo antes da “Resolução do Conselho e dos Ministros da Educação”, de 1990, diversos países europeus, como Itália, França e Inglaterra e alguns países norte-americanos, como Estados Unidos e Canadá, haviam implementado programas de inclusão escolar de crianças com DM, física e sensorial. Na Itália, um dos países pioneiros na inclusão escolar de crianças com necessidades especiais, após uma tentativa desastrosa na década de 1970, de fechar as escolas especiais e promover a inclusão de forma abrupta, foram adotadas políticas públicas que propiciaram uma inclusão gradativa e realmente consistente. As escolas foram readaptadas em sua estrutura física, para poder receber os novos alunos, e havia limitação de dois alunos especiais por cada sala de aula e essas salas não poderiam ter mais de 20 alunos. Diante disso, professores especializados foram contratados para todas as salas que recebessem crianças especiais. Fora do ambiente escolar eram mantidas as terapias clínicas de apoio necessárias, como atendimento médico, fisioterápico, psicológico e fonoaudiológico.

A perspectiva de inclusão universal de alunos com necessidades especiais é impulsionada em 1990, com a aprovação da “Resolução do Conselho e dos Ministros da Educação”, publicada no Jornal Oficial das Comunidades Europeias. Por intermédio dessa resolução os membros da União Europeia se comprometerame a intensificar e unir esforços para integrar os alunos especiais nas escolas comuns; a optar pela inclusão educacional das crianças especiais sempre que adequado; a estreitar as relações entre escola, família e sociedade, visando ampliar os ideais de inclusão; a melhorar a qualidade de ensino aos alunos especiais dentro do ensino regular, propiciando autonomia a eles; a oferecer ensino diferenciado aos alunos deficientes, quando incluídos no ensino comum; a avaliar individualmente as necessidades especiais de cada aluno; a disponibilizar os métodos de ensino desenvolvidos no ensino especial para os alunos especiais incluídos nas escolas comuns; e a estimular a cooperação entre as instituições e organismos interessados na inclusão educacional de alunos com necessidades especiais, incluindo a equipe de saúde(11).

A necessidade de refletir, ampliar e uniformizar o conhecimento sobre educação inclusiva se manifestou em diversos encontros internacionais. Em março de 1990 ocorreu em Jomtien, Tailândia, a “Conferência Mundial sobre Educação para Todos”, durante a qual cem líderes mundiais se comprometeram com a erradicação do analfabetismo em todo o mundo até o ano 2000. Nessa conferência foram estabelecidos dez objetivos: 1) satisfazer as necessidades básicas de aprendizagem para crianças, jovens e adultos; 2) expandir o enfoque para além dos níveis atuais de recursos, das estruturas institucionais, dos currículos e dos sistemas convencionais de ensino; 3) universalizar o acesso à educação; 4) concentrar a atenção mundial na aprendizagem; 5) ampliar a educação básica para todos; 6) propiciar um ambiente adequado para a aprendizagem 7) fortalecer as alianças para que as autoridades em nível nacional, estadual e municipal tenham a obrigação prioritária de proporcionar educação básica para todos, contando sempre com o envolvimento dos educadores e familiares; 8) desenvolver uma política de apoio à educação mais eficaz; 9) mobilizar recursos para a educação em todo o mundo; e 10) fortalecer a solidariedade internacional(12,13).

Em 1994, reuniram-se na Espanha representantes de 88 países e de 25 organismos internacionais na “Conferência Mundial de Educação Especial”, que culminou com a assinatura da “Declaração de Salamanca” sobre os princípios e políticas da educação especial em todo o mundo. A “Declaração de Salamanca” contém 85 artigos, que atribuem a mais alta prioridade política e financeira à educação especial e propõem a inclusão das pessoas com necessidades especiais no ensino comum e sua participação social de forma plena(12,14).

Anos mais tarde (2001) é realizada a “Convenção Interamericana para Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra as Pessoas Portadoras de Deficiência” (Convenção da Guatemala), abolindo todas as formas de discriminação social contra deficientes mentais, físicos e sensoriais(11,14).

No Brasil, em 2004, a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão editou um documento intitulado “O acesso de alunos com deficiência às escolas e classes comuns da rede regular”(14), com o objetivo de implementar uma política nacional de educação realmente inclusiva. Segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), “o atendimento educacional especializado será feito em classes, escolas ou serviços especializados, sempre que, em função das condições específicas dos alunos, não for possível sua integração nas classes comuns do ensino regular” (art. 59, § 2º) (10). Quando esse artigo da LDBEN é analisado isoladamente, pode-se concluir que para indivíduos com DM o ensino regular em escola comum pode ser automaticamente substituído pelo ensino especializado em ambiente distinto, o que consiste em uma interpretação equivocada da lei. Como a própria Constituição Federal (art. 208) determina que o acesso ao Ensino Fundamental é obrigatório, fica claro que, regra geral, a participação do aluno no ensino especializado não exclui sua possibilidade nem seu direito de participar da escola comum. Desse modo, juridicamente, fica muito claro que as diretrizes educacionais previstas na LDBEN e na Constituição Federal não tornam possível a substituição do ensino oferecido nas classes comuns das escolas regulares pelo ensino oferecido nas escolas de educação especializada(16).

Uma visão particular sobre a realidade brasileira

Para que possamos compreender o momento atual do processo de inclusão educacional no Brasil, é necessário observarmos o arcabouço legal existente. A Constituição Federal garante a todos o direito à educação e ao acesso à escola, não podendo excluir nenhuma pessoa em razão de sua origem social, raça, sexo, idade ou deficiência. Desse modo, segundo o Art. 205 da Constituição Federal Brasileira, “A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da soiedade visando o pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”(16). Segundo o Art. 246 do Código Penal Brasileiro, “Deixar criança em idade apropriada, sem justa causa, sem a escolaridade obrigatória corresponde a crime de abandono intelectual”(18).

Embora do ponto de vista teórico, a inclusão das crianças com necessidades especiais nas escolas comuns já esteja legalmente prevista, há casos em que ela não pode ser realmente efetivada. Como já vimos anteriormente, a DM apresenta graus variados. Não resta dúvida de que crianças com DM leve, bem como todas aquelas com deficiência motora pura, devem ser mantidas nas escolas comuns, com apoio pedagógico individualizado. É importante ressaltar que, quanto maior o comprometimento cognitivo (particularmente nos graus severo e profundo), maior sua associação com alterações motoras (encefalopatia não evolutiva da infância, tipo paralisia cerebral), sensoriais e distúrbios comportamentais.
Trabalhando há anos em escolas de ensino especializado no Brasil, em nossa opinião, está muito claro que algumas crianças se encontram fora de possibilidade pedagógica. Ou seja, embora possam e devam receber orientações e treinamento para que, dentro de suas capacidades, consigam adquirir o maior grau de independência possível, elas jamais poderão ser alfabetizadas. Muitas dessas crianças não serão capazes nem mesmo de realizar atividades de vida diária mais elementares. Parte considerável das crianças, adolescentes, jovens e adultos que hoje se encontram nas escolas especiais é considerada absolutamente dependente de cuidados de terceiros, incluindo higiene pessoal e alimentação. Considerando que o trabalho do professor tem por objetivo fundamental a instrução pedagógica, não se pode transformar a sala de aula da escola comum em um ambiente de cuidados médicos nem o professor em um terapeuta clínico. Essa não é a vocação dos educadores e tão pouco eles apresentam formação técnica para realizar esses cuidados.

Por outro lado, não há dúvida de que a inclusão escolar significa muito mais do que fornecer um ambiente educacional adequado para crianças especiais. Mesmo para aquelas que estão fora da possibilidade pedagógica, a socialização com crianças de cognição normal se torna o objetivo principal. O que nem sempre é possível, em verdade.

O grande espectro de patologias, bem como de condições físicas, mentais e comportamentais tornam o assunto “inclusão escolar” complexo, exigindo discussão e abordagens diferenciadas para cada caso. Contudo, determinar por meio de leis que todas as crianças com necessidades especiais sejam matriculadas nas escolas comuns representa uma visão superficial e simplista do problema. É tentar uma solução fácil para um problema complexo. Infelizmente, uma parte considerável das escolas regulares não apresenta condições (tanto estruturais como de docência) para oferecer o atendimento adequado, nem mesmo para os alunos ditos “normais” do ensino fundamental, como prevê a lei. É pouco mais que uma ilusão acreditar que a simples criação e implementação de leis transformará as escolas comuns em ambientes educacionais satisfatórios às necessidades de todas as crianças portadoras de necessidades especiais.


Bibliografia
1. Kabra M, Gulati S. Mental retardation. Indian J Pediatr. 2003; 70(2):153-8.
2. Patterson MC, Zoghbi HY. Mental retardation. X marks the spot. Neurol. 2003; 61:156-7.
3. Ainsworth P, Baker P. Understanding mental retardation. United States of America: University Press of Mississippi, 2004.
4. Diagnostic and statistical manual of mental disorders. 4th ed. Washington, DC: American Psychiatric Association; 1994. p.39-46.
5. Disponível em http://www.faqs.org/childhood/Re-So/Retardation.html. Acesso em 15/06/2011.
6. Disponível em . Acesso em 10/04/2011.
7. Disponível em < http://www.fepe.org.br/historico.html&gt;. Acesso em 12/05/2011.
8. Burack JA. Differentiating mental retardation: the two-group approach and beyond. In: Hodapp RM, Burack JA, Zigler E (ed). Issues in the Developmental Aprroach to Mental Retardation. Los Angeles: Cambridge University Press, 1990. p. 27-48.
9. ICD-10. Guide for mental retardation – division of mental health and prevention of substance abuse. World Health Organization. Geneva, 1996.
10. Disponível em . Acesso em 07/04/2011.
11. Disponível em http://www.european-agency.org/publications/ereports/key-principles-for-promoting-quality-in-inclusive-education/key-principles-PT.pdf. Acesso em 13/05/2011.
12. Lima PA. Contextos e pressupostos. In: Lima PA (ed). Educação inclusiva e igualdade social. São Paulo: AVERCAMP Editora, 2006. p. 17-26.
13. Declaração Mundial sobre Educação para Todos. Aprovada pela Conferência Mundial sobre Educação para Todos. Jomtien, Tailândia, 1990. Disponível em 14. Declaração de Salamanca Sobre Princípios, Políticas e Práticas na Área de Necessidades Educativas Especiais. Disponível em http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/salamanca.pdf. Acesso em 12/05/2011.
15. Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra as Pessoas Portadoras de Deficiência. Convenção da Guatemala, ratificada pelo Decreto nº 3.956, de 8/10/2001. Disponível em http://www. ampid.org.br/Docs_PD/Convencoes_ONU_PD.php#guatemala. Aceso em 06/04/2011.
16. O Acesso de Alunos com Deficiência às Escolas e Classes Comuns da Rede Regular / Ministério Público Federal / 2ª ed. Brasília: Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, 2004.
17. BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Brasília, DF: Senado, 1988.
18. BRASIL. Código Penal. Decreto-lei número 2.848, de 7 de dezembro de 1940.

Fonte: Federação Nacional das APAEs.

APAE – Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais é um Movimento que se destaca no país pelo seu pioneirismo. Nascida no Rio de Janeiro, no dia 11 de dezembro de 1954, na ocasião da chegada ao Brasil de Beatrice Bemis, procedente dos Estados Unidos, membro do corpo diplomático norte-americano e mãe de uma portadora de Síndrome de Down. No seu país, já havia participado da fundação de mais de duzentas e cinqüenta associações de pais e amigos; e admirava-se por não existir no Brasil, algo assim.

Motivados por aquela cidadã, um grupo, congregando pais, amigos, professores e médicos de excepcionais, fundou a primeira Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais – Apae do Brasil. A primeira reunião do Conselho Deliberativo ocorreu em março de 1955, na sede da Sociedade de Pestalozzi do Brasil. Esta colocou a disposição, parte de um prédio, para que instalassem uma escola pra crianças excepcionais, conforme desejo do professorLa Fayette Cortes.

A entidade passou a contar com a sede provisória onde foram criadas duas classes especiais, com cerca de vinte crianças. A escola desenvolveu-se, seus alunos tornaram-se adolescentes e necessitaram de atividades criativas e profissionalizantes. Surgiu, assim, a primeira oficina pedagógica de atividades ligadas à carpintaria para deficientes no Brasil, por iniciativa da professora Olívia Pereira.

De1954 a1962, surgiram outras Apaes. No final de 1962, doze das dezesseis existentes, nessa época, encontraram-se,em São Paulo, para a realização da primeira reunião nacional de dirigentes apaeanos, presidida pelo medico psiquiatra Dr. Stanislau Krynsky. Participaram as de Caixias do Sul, Curitiba, Jundiaí, Muriaé, Natal, Porto Alegre, São Leopoldo, São Paulo, Londrina, Rio de Janeiro, Recife e Volta Redonda. Pela primeira vez no Brasil, discutia-se a questão da pessoa portadora de deficiência com um grupo de famílias que trazia para o movimento suas experiências como pais de deficientes e, em alguns casos, também como técnicos na área.

 Para uma melhor articulação de suas idéias, sentiram a necessidade de criar um organismo nacional. A primeira idéia era a formação de um Conselho e a segunda a criação da Federação de Apaes. Prevaleceu esta ultima que foi fundada no dia 10 de novembro de 1962, e funcionou durante vários anosem São Paulo, no Consultório do Dr. Stanislau Krynsky. O primeiro presidente da diretoria provisória eleita foi Dr. Antonio Clemente Filho.

Com a aquisição da sede própria a Federação foi transferida para Brasília. Adotou-se como símbolo a figura de uma flor ladeada por duas mãos em perfil, desniveladas, uma em posição de amparo e a outra de proteção.

A Federação, a exemplo de uma Apae, se caracteriza por ser uma sociedade civil, filantrópica, de caráter cultural, assistencial e educacional com duração indeterminada, congregando como filiadas as Apaes e outras entidades congêneres, tendo sede e fórum em Brasília –DF.

O Movimento logo se expandiu para outras capitais e depois para o interior dos Estados. Hoje, decorridos cinqüenta e três anos, são mais de duas mil, espalhadas pelo Brasil. É o maior movimento filantrópico do Brasil e do mundo, na sua área de atuação. É uma explosão de multiplicação, verdadeiramente notável sob todos os aspectos, levando-se em conta as dificuldades de um país como nosso, terrivelmente carente de recursos no campo da Educação e mais ainda, na área de Educação Especial. Este crescimento vertiginoso se deu graças à atuação da Federação Nacional e das Federações Estaduais, que, seguindo a mesma linha filosófica da primeira, permitiram e incentivaram a formação de novas Apaes. Estas, através de congressos, encontros, cursos, palestras etc, sensibilizam a sociedade em geral, bem como, viabilizam os mecanismos que garantam os direitos da cidadania da pessoa com deficiência no Brasil.

A Apae, vem a ser constituída, integrada por pais e amigos de uma comunidade significativa de alunos portadores de necessidades especiais, contando para tanto com a colaboração da sociedade em geral, do comercio, da indústria, dos profissionais liberais, dos políticos, enfim, de todos quantos acreditam, apostam e lutam pela causa da pessoa com deficiência.

A entidade em grande parte apesar de gozar do registro como associação de utilidade pública em todos ao quadrantes federal, estadual e municipal; defronta-se com as mais diversas dificuldades, essencialmente no tocante a pessoal e a questão financeira. Estes últimos recursos talvez sejam insignificantes, se comparados à importância do compromisso que todo integrante do movimento tem diante da sociedade, da família e da própria pessoa com deficiência.

 As três primeiras Apaes fundadas no Brasil

APAE

ESTADO

DATA FUNDAÇÃO

Rio de Janeiro

RJ

11/12/1954

Brusque

SC

14/09/1955

Volta Redonda

RJ

09/04/1956

Primeiras Apaes fundadas por estado

ESTADO

APAE

DATA FUNDAÇÃO

Acre

Rio Branco

31/07/1981

Alagoas

Maceió

20/08/1964

Amazonas

Manaus

04/05/1973

Amapá

Macapá

27/09/1966

Bahia

Salvador

03/10/1968

Ceará

Fortaleza

28/08/1965

Distrito Federal

Brasília

22/08/1965

Espírito Santo

Vitória

27/05/1965

Goiás

Goiânia

15/05/1969

Maranhão

São Luís

10/03/1971

Minas Gerais

São Lourenço

01/06/1956

Mato Grosso do Sul

Campo Grande

10/06/1967

Mato Grosso

Cuiabá

06/10/1967

Pará

Belém

30/11/1962

Paraíba

João Pessoa

23/03/1957

Pernambuco

Recife

27/10/1961

Piauí

Teresina

04/06/1968

Paraná

Curitiba

06/10/1962

Rio de Janeiro

Rio de Janeiro

11/12/1954

Rio Grande do Norte

Natal

31/10/1959

Rondônia

Vilhena

12/02/1981

Roraima

Rio Grande do Sul

São Leopoldo

07/08/1961

Santa Catarina

Brusque

14/09/1955

Sergipe

Aracaju

27/08/1967

São Paulo

Jundiaí

07/08/1957

Tocantins

Araguaína

22/01/1986

Presidentes da Federação Nacional das Apaes

(1963-1965) – Dr. Antonio dos Santos Clemente Filho

(1965-1967) – Antonio Semas S. Figueira (In Memoriam)

(1967-1977) – José Cândido Maes Borba (In Memoriam)

(1977-1981) – Justino Alves Pereira

(1981-1987) – Elpidío Araújo Neris

(1987-1991) – Nelson de Carvalho Seixas

(1991-1995) – Flávio José Arns

(1995-1999) – Eduardo Luiz Barros Barbosa

(1999-2001) – Flávio José Arns

(2001-2005) – Luiz Alberto Silva

(2006-2008) – Eduardo Luiz Barros Barbosa

(2009-2011) – Eduardo Luiz Barros Barbosa 

“Co-fundador e tendo sido eleito para ocupar o cargo de primeiro Presidente da Federação Nacional das Apaes então com sedeem São Pauloe na ocasião docente da UNIFESP (Universidade Federal de São Paulo), valeu-me a boa disposição do Excelentíssimo Ministro da Educação, que intercedeu por mim junto a Reitoria da Universidade, permitindo-me cuidar dos assuntos da Federação Nacional das Apaes.

A Federação Nacional das Apaes se desenvolveu nos últimos vinte anos na medida em que mais Associações de Pais e Amigos dos Excepcionais se constituíram, ultrapassando mais de duas mil Apaes espalhadas pelo Brasil, lutando para poderem oferecer às crianças deficientes mentais, os meios para se integrarem na comunidade e poderem, como as outras crianças, se desenvolverem e tornarem-se cidadãos prestantes, muitas vezes autônomos e por vezes arrimo da família.”

 GESTÃO 1967 – 1977

PRESIDENTE: José Cândido Maes Borba (In Memoriam)

“A minha relação com o Movimento, antes de assumir a Presidência da Federação Nacional das Apaes, vem desde o ano de 1.954, por ocasião da fundação da Apae Guanabara (hoje Apae Rio) a primeira a surgir em nosso país e que deu início ao Movimento Apaeano no Brasil.

Como sempre observamos, as comunidades, em geral, solicitavam o nosso apoio para que nelas fossem criadas uma Apae. Isto significa que a filosofia do nosso trabalho, a honestidade com que são desenvolvidos os nossos Programas e executados através de um idealismo uníssono de norte ao sul do país, lhes conferia uma certeza para a solução do problema de atendimento ao excepcional.

Até setembro de 1.972 existiam 108 Apaes filiadas e foi em 1.973 que o Movimento tomou um grande impulso. Em 1.979 as Apaes já estavam 100% filiadas e, a partir daí, o número delas aumentou de uma maneira surpreendente. Foi adotada a orientação de que as reuniões da Diretoria seriam rotativas, encarando-se a necessidade de se levar às várias regiões do país, a conscientização de que isto, na realidade, representa um Movimento nacional, procurando-se trabalhar uma unidade de doutrina, da filosofia, em fim, dar às Associações uma mesma diretriz, dentro da política por elas mesmas traçadas. A Federação teve que se estruturar para atender os objetivos das Apaes, nascendo vários eventos como as Olimpíadas, Exposição de Artes e os Congressos, sendo que no V Congresso Nacional das Apaes realizado no Rio de Janeiro em 1971, esteve presente o Presidente da República Emílio Garrastazu Médice.

A partir de1977 aFederação promove a Exposição de Artes juntamente com o Congresso Nacional, sendo expostos os vinte melhores trabalhos selecionados em exposições estaduais. A primeira foi realizada em Teresina/PI e a segunda em Florianópolis/SC.

Durante esses anos, a Federação se fazia representar em eventos nacionais e internacionais, discutiu diretamente com os Ministérios da Educação e Cultura, da Saúde, do Trabalho, da Previdência Social e da Justiça os problemas relacionados com os excepcionais, com as Entidades, principalmente para obtenção de recursos físicos, materiais, financeiros necessários ao desenvolvimento do trabalho que elas executam. Da mesma forma e com o mesmo objetivo, com Governadores e Secretários de vários Estados, bem como, com dirigentes de serviços de educação especial e prestou colaboração aos Poderes Legislativos nos seus interesses de propiciarem medidas legais de amparo ao excepcional.

O nosso Movimento Apaeano cresce e se expande cada vez em maior intensidade e, com ele cresce também, a responsabilidade e o trabalho. Por isso é imprescindível que todos se integrem a Federação Nacional das Apaes e por ela lutem, porque dessa união de esforço, nesse espírito de unidade que nos caracteriza, está a grande força e o grande prestígio do nosso Movimento e das nossas Apaes.”

 GESTÃO 1977 – 1981

PRESIDENTE: Justino Alves Pereira

Nestes 50 anos de atividades do Movimento Apaeano, “iniciando como alguém que andasse na escuridão de um grande túnel, iluminando-o com uma pequena vela, até atingir-se, como ocorreu à plenitude do reconhecimento Comunitário e Governamental de hoje, quanto à prevenção e ao atendimento multidisciplinar de habilitação para vida plena da Pessoa Deficiente, quanto às suas características mentais, físicas e sensoriais, tão bem caracterizadas por S. João Maria de Vianey, pelo Aleijadinho e pelo Presidente Roosevelt, por Beethowen e por Helen Keller, culminando com a lei da CORDE, que eu chamo de Lei da Abolição da Escravatura do Deficiente, graças aos Presidentes Tancredo Neves e José Sarney, bem como, o Decreto que a regulamentou 3298/99, devido ao Presidente Fernando Henrique Cardoso, somando-se a esse intenso trabalho, os bens materiais adquiridos como as sedes anterior e atual da Federação Nacional das Apaes.

Não trocamos nosso filho excepcional por nenhuma fortuna deste mundo, mas daríamos toda a fortuna do mundo para evitar que alguém tenha um filho excepcional e para que, caso o tenha, não sinta as limitações legais e sociais que sentimos até hoje.”

GESTÃO 1981 – 1987

Presidente: Elpídio Araújo Neris

“No ano de 1981 foi realizada a primeira campanha promocional da Fenapaes, patrocinada pelo Cine Foto Júnior de São Paulo, com o apoio da FIESP. Em 1982 foi quitada, antecipadamente, o financiamento da atual sede da Fenapaes e realizada uma campanha nacional, cujos resultados significativos, marcou o início da independência econômica do Movimento Apaeano. Os recursos arrecadados foram distribuídos entre as 300 Apaes filiadas. Em 1983 na Abertura do Congresso Nacional em Fortaleza/CE, fui reeleito e foi lançado o desafio ao Governo Federal para a criação de um organismo formador da política de integração da pessoa portadora de deficiência e, ao mesmo tempo, coordenador das ações do Governo e de auxílio às entidades. Como resposta a esse desafio, foi criado o Comitê Governamental do qual participei e que estudou e sugeriu a criação da CORDE e de seu Conselho Consultivo hoje CONADE. A Federação foi membro do Conselho da Liga Internacional de Associações pró Deficientes Mentais, hoje Inclusão Internacional, e nessa condição participou de suas reuniões, congressos, seminários e encontros em vários países da América, Europa, Ásia e África. Juntamente com a Apae de Niterói, a Federação Nacional organizou, realizou e presidiu o 9º Congresso Mundial da Liga Internacional que foi realizado no Brasil em 1986, Hotel Nacional na cidade do Rio de Janeiro, o único sediado na América do Sul.”

 GESTÃO 1987 – 1991

PRESIDENTE: Nelson de Carvalho Seixas 

“Ao tomar conhecimento da existência do Movimento Apaeano, interessei-me na fundação de uma unidade na minha cidade São José do Rio Preto /SP que aconteceu em 22 de maio de 1964, movido também pela condição de pai de dois filhos portadores de deficiência mental, nascidos respectivamente em 1956 e 1960, iniciando-se assim a minha relação com o Movimento das Apaes. Antes de assumir a Presidência da Federação Nacional das Apaes, participei ativamente das suas ações, incentivando e colaborando na criação e organização de numerosas Apaes na Região Oeste eem outras Regiõesdo Estado de São Paulo e nos Estados circunvizinhos (Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul) e vários encontros e reuniões no Estado de São Paulo e Região          Sul para troca de experiências, sendo que nessa época havia poucos técnicos na área (professores e alguns psicólogos), pouca literatura e escassez de material pedagógico.

Já como Presidente da Federação Nacional das Apaes, participei como parlamentar da Constituinte, conseguindo inserir na Carta Magna de 1988 vários dispositivos em benefício das pessoas portadoras de deficiência, além de conseguir que as Apaes participassem dos colegiados, fazer parte do Conselho Nacional da Saúde, indicar a Coordenadora da CORDE e de outras numerosas ações que fortificaram a unidade apaeana e a sua expansão pelo Brasil. Já tive oportunidade de afirmar e reafirmar que, se o nosso Movimento não existisse, teria que ser inventado, pois centrando na pessoa portadora de deficiência mental, oferecendo-lhe um atendimento multidisciplinar, apóia a sua família, orienta a comunidade, conseguindo de todos uma participação essencial para o êxito do trabalho. Assim, é que serve de exemplo para outros segmentos sociais, como é o dos portadores de distúrbios mentais. Tive sempre a preocupação em fazer com que as várias comunidades se conscientizem frente à problemática, assumissem sua parcela de              responsabilidade e, assim crescendo o Movimento Apaeano viesse a adquirir a força e a expressão que tem hoje no País e no Mundo.”

 GESTÃO 1991 – 1995 e 1999 – 2001

 PRESIDENTE: Flávio José Arns

“Entre os anos de 1991 a1995 e 1999 a2001, tive a honra de presidir a Federação Nacional das Apaes. Foram momentos de grandes desafios e também conquistas importantes para o Movimento Apaeano, como a luta constante para expandir a presença das Apaes em mais municípios brasileiros e para a formação de diretoria das entidades, professores e técnicos. Nesta caminhada, tivemos a oportunidade de vivenciar experiências importantes, como a consolidação de reforma estatutária nos seus quatro níveis: Apaes em seus municípios, Delegacias Regionais dentro dos Estados, Federações Estaduais e Federação Nacional. Batalhamos também pela viabilização de eventos realizados pela Federação Nacional, como os Congressos Nacionais, Olimpíadas, 1º Festival Nacional Nossa Arte, 1ª versão do sorteio Apae Noel, 1º Fórum Nacional de Autodefensores, bem como a implantação do Programa Apae Educadora. O Movimento das Apaes, ou Movimento Apaeano, é considerado o maior do mundo na luta em defesa dos direitos do portador de deficiência mental. Hoje, somos 2.000 Apaes em todo o país, resultado da conscientização de pais e amigos que foram encontrando seu verdadeiro caminho e expandindo suas associações por todo o território nacional. A importância do Movimento está no trabalho voltado para a busca da qualidade de vida do portador de deficiência, desde a sua concepção até a velhice, através da prestação de serviços de qualidade. O Movimento é importante para a inclusão social do portador de deficiência mental e apoio à sua família, por meio de um esforço coordenado dos pais, profissionais, amigos e da própria pessoa portadora de deficiência.”

 GESTÃO 1995 – 1999

Presidente: Eduardo Luiz Barros Barbosa

Sinto-me privilegiado por ter presidido a Federação Nacional das Apaes por 4 anos. Orgulho por perceber que as transformações acontecem quando existe a mobilização de pessoas de boa vontade e, ao conhecê-las de perto, sentir aguçar-se a esperança que nos impulsiona para a construção de um mundo melhor para todos, sejam suas necessidades comuns ou especiais. Orgulho pela oportunidade de representar as Apaes em diversas instâncias, promover a filiação de 402 novas entidades e ter me aprimorado a partir de tantas e ricas experiências pessoais com nossos companheiros, pais e alunos. Por ter vivido tudo isso e ter as mãos estendidas, com fé no ser humano e a convicção de poder servir de apoio à pessoas tão numerosas. E, se elas ainda não tiveram atingido o estágio de dignidade, que eu possa dedicar-me, inteiramente, à sua felicidade. Aprendi que sem esse gesto ninguém aprende a caminhar. Acredito que a causa Apaena personifica desde o seu início, a coragem necessária para se enfrentar problemas, compreendendo que o seu papel social significa a possibilidade de solução para todos aqueles que chegam até nós. O nosso Movimento é a experiência viva de que a opção pelo outro ainda é viável. Uma expressão autêntica de cidadania influindo, através do exemplo institucional e atuação comunitária, nas diretrizes das políticas públicas oferecidas aos menos favorecidos.”

GESTÃO 2001 – 2005

Presidente: Luiz Alberto Silva

“Como cidadão sinto-me privilegiado pela oportunidade de ser Presidente da Federação Nacional das Apaes. É um exercício diário de aquisição de conhecimentos, de valorização da vida, de responsabilidade social, de desafios, de tomadas de decisões, de aglutinações de experiências absorvidas pelo trabalho compartilhado com companheiros apaeanos, tendo como objetivos primordiais: os direitos da pessoa com deficiência mental, o aprimoramento e o fortalecimento do Movimento das Apaes. É um aprendizado! É um marco na história da minha vida, poder trabalhar por uma causa tão nobre. O Movimento das Apaes, organização reconhecida nacionalmente, se destaca pelos serviços destinados à valorização humana, voltados especificamente à pessoa com deficiência mental, às suas famílias e comunidades.

Nesta caminhada sempre tivemos as indispensáveis parcerias da sociedade brasileira e dos Governos Federal/Estadual/Municipal para o cumprimento da missão das Apaes.”

GESTÃO 2006 – 2008 / 2009 – 2011

Presidente: Eduardo Luiz Barros Barbosa

Por Fernanda Travassos-Rodriguez

Fala-se muito a respeito da inclusão escolar e social do indivíduo com Síndrome de Down, contudo se esquece de que quem apresenta e inclui a criança desde o nascimento na sociedade é a própria família. Alguns pais de bebês, vítimas de um (pré) conceito internalizado, muitas vezes, enraizado e tácito, retraem-se do contato social aparentemente por temor ao preconceito alheio. No entanto, não se dão conta de que através dos olhos de outros possam ver o reflexo de seus próprios afetos temidos e guardados, que freqüentemente despertam-lhes sentimentos de vergonha e culpa.

Cada um de nós constrói ao longo da vida suas crenças, valores, conceitos e mesmo preconceitos. Este processo é uma construção em via de mão dupla com o meio em que vivemos. Escrevemos a nossa história dentro de uma época, de uma família e de uma sociedade. Sem este contexto, não poderíamos atribuir valor a nada nas nossas vidas. São os nossos paradigmas. Entretanto, pensando em práticas sociais, podemos dizer que o mundo de alguma maneira nos forma, mas também podemos dizer que formamos o mundo, pois são as nossas idéias, produto da nossa história com o nosso meio, que “realimentam” os paradigmas da nossa cultura. Sendo assim, o preconceito social não existe como uma “entidade própria”, ele é constantemente reproduzido pela maioria de nós no cotidiano.

Muitos pais de crianças com Síndrome de Down, passaram grande parte da vida sem terem contato com nenhuma criança, adolescente ou adulto nestas condições. Formaram (pré) conceitos sobre a síndrome e seus portadores, assim como todos nós formamos (pré) conceitos sobre uma infinidade de temas que genuinamente desconhecemos. No momento que alguém se torna pai, mãe ou mesmo irmão de um bebê com Síndrome de Down seus preconceitos não desaparecem de imediato e isto pode causar muita dor e como já citamos há uma mistura de culpa e vergonha dos próprios sentimentos e da condição filho ou irmão.

Como a palavra preconceito na sua etimologia assinala, trata-se de uma idéia construída a priori, de forma precoce e que não inclui uma vivência ou conhecimento acerca do objeto alvo de julgamento. Concluímos, portanto, que a única maneira de transformar o preconceito pessoal e/ou social, visto que eles estão intimamente relacionados, é através da informação e da proximidade com o tema. Vemos que muitas pessoas são capazes de transformar os seus preconceitos acerca dos portadores de diversos tipos de deficiência ao longo de um intenso aprendizado de vida com os próprios filhos, mas, às vezes, por uma série de fatores, outros pais não têm esta possibilidade e mantém o preconceito “engavetado”, mascarado sob uma série de atitudes que acabam por reforçar a exclusão social do próprio filho. São pessoas sofridas e que não conseguiram transformar as suas crenças. Precisam de ajuda, mas, muitas vezes nem sabem.

A presença do indivíduo com Síndrome de Down na escola regular, na mídia e na sociedade de forma mais ampla denota uma mudança produzida pela nossa subcultura, já que acreditamos que tais elaborações são recíprocas. Não se trata de um movimento independente do nosso contexto, senão não seria significativo. Assistimos hoje um momento que pode se tornar histórico, um ponto de bifurcação que pode gerar uma mudança do conceito que se tinha sobre a pessoa com Síndrome de Down dentro do imaginário social. Isto não muda a sociedade em si, isto muda as idéias das pessoas que contróem socialmente valores, normas, padrões, conceitos e preconceitos.

Contudo, podemos dizer que a inclusão começa em casa, seja em relação aos pais que têm filhos com Síndrome de Down, seja com pais que têm filhos sem nenum tipo de síndrome e que permitem que seus filhos conheçam, se aproximem e convivam com as diferenças. Todos nós estamos incluídos nesta história e enquanto as pessoas não se derem conta disso, apenas os que sofrem o preconceito na própria carne serão capazes de pensar em alternativas para a transformação social. No caso da criança com Síndrome de Down, como já vimos, existe uma grande necessidade que ela seja genuinamente inserida na sua família para que possamos pensar em qualquer tipo de inclusão, pois uma inclusão que não é baseada em crenças verdadeiras dos próprios pais não funciona, não vinga e não transforma aqueles que cercam a criança. Dizemos isto porque a luta pela inclusão na nossa sociedade consiste em um batalha muito dura. Há uma guerra travada com aqueles que não aceitam nem as próprias diferenças e vivem em busca de modelos ideais. Portanto, a família que não trabalha muito bem todas estas questões dentro de si, provavelmente terá pouca energia para ir mais longe nesta luta e, então, fica muito difícil pensar em inclusão escolar e social.

Os pais, muitas vezes, têm um preconceito que é anterior (como a própria palavra já diz) ao nascimento do filho e com freqüência não se dão conta disto até que alguém os aponte. Com este preconceito internalizado e muitas vezes culpados por estes sentimentos camuflam esta questão. Tal problemática fica evidenciada quando tentam incluir seu filho na vida escolar e social. Nestes casos, vemos a necessidade de um trabalho cuidadoso e minucioso junto aos familiares que não se trata de orientação, nem prescrição, pois assim não damos espaço para acolher o lado preconceituoso dos próprios pais e dar-lhes a possibilidade de transformação, trata-se mesmo de um trabalho psicoterápico realizado por profissional especializado no assunto.

Na pesquisa de campo para a tese de doutorado: Síndrome de Down – da estimulação precoce ao acolhimento familiar precoce, percebemos que atitudes prescritivas e imperativas dos profissionais que lidam com pais de crianças com Síndrome de Down aumentavam ainda mais o preconceito internalizado dos pais em relação aos filhos, visto que os pais, ao se sentirem recriminados por se identificarem com atitudes preconceituosas, guardavam e escondiam mais ainda dentro de si, tais sentimentos considerados por eles vergonhosos, ao ponto de não mais reconhecer o próprio preconceito, ter a possibilidade de entrar em contato com ele e transformá-lo. Portanto, com o tempo fica cada vez mais difícil ajudar e identificar esta parcela da sociedade que teve o seu preconceito silenciado por não ter acesso a um espaço com profissionais especializados que pudessem suportar escutar e acolher junto com os pais as angústias próprias de um momento tão delicado: o tornar-se familiar de um bebê com a Síndrome de Down.

Quando este trabalho é feito ou quando as famílias conseguem realizá-lo de maneira natural a criança está pronta para ser inserida numa esfera maior. O bebê com Síndrome de Down pode ser inserido na sociedade desde bem pequeno quando freqüenta em seus passeios de carrinho os mesmos lugares que os outros bebês considerados “normais”, freqüenta as reuniões de família, as festinhas de outras crianças e todas as outras coisas que qualquer criança deveria fazer. No entanto, mais tarde, através da escola haverá uma inclusão mais contundente que colocará a prova o preconceito de cada educador com que a criança se deparar e também o dos outros pais de crianças que freqüentem a mesma escola, no caso de escolas regulares.

O momento da inclusão escolar é muito complicado para a família da criança com Síndrome de Down, mesmo que ela tenha trabalhado bem suas questões relativas ao preconceito. Isto porque os pais temem a exposição do próprio filho a um ambiente que muitas vezes é hostil ou despreparado para lidar com as diferenças. Ficam com medo da discriminação e querem proteger o filho de qualquer tipo de sofrimento. Contudo, as crianças vão para a escola não só para aprender português ou matemática, mas também para se socializar. Vão aprender na prática as regras do nosso convívio e por isso é tão importante que a criança com Síndrome de Down possa participar disso também. Em primeiro lugar, ela ensina aos colegas que a vida é feita de diferenças e que é possível lidar com as mesmas sem ter que buscar modelos ideais. Em segundo lugar, a criança com Síndrome de Down começa desde bem cedo a aprender a ter que lidar com a sociedade como ela é. Não se criam mundos paralelos para a criança que, nestes casos, apenas na adolescência começará a se deparar com um mundo diferente do que construíram para ela. Isto causa sofrimento e cria mais dificuldades no processo de inclusão deste indivíduo. Finalmente, acreditamos que um trabalho bem feito de inclusão começa dentro de casa e isto modifica a sociedade e facilita a vida destas crianças em um futuro próximo. Afinal, estamos todos dentro deste grande barco chamado sociedade.

Este texto foi publicado no “O Estado de S. Paulo” em maio de 2005 e as dúvidas e incertezas à respeito da inclusão de crianças com necessidades especiais na rede regular / normal de ensino continuam as mesmas…

Uma cartilha do Ministério Público Federal, apoiada pelo Ministério da Educação (MEC), que determina a inclusão em escolas comuns de todas as crianças com deficiência tem provocado polêmica e evidenciado uma briga entre duas correntes de especialistas do setor.

De um lado, há os que defendem o direito de todo deficiente de estudar com outras crianças e acreditam que isso levará a uma abertura da escola à diversidade, mudando a educação no País. Do outro, estão tradicionais associações que mantêm escolas especiais e afirmam que certos graus de deficiência não permitem a inclusão. Para elas, também não há preparo de professores e estrutura na rede pública de ensino para receber todos esses novos alunos.

Alheios à discussão teórica, os pais se dizem assustados. “Eu tenho o direito de escolher a escola do meu filho”, afirma a professora aposentada Carmem Luiza Cestari, mãe de Tales, que tem síndrome de Down e outras complicações que o impedem de falar. O menino, de 16 anos, está sendo alfabetizado em escolas da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae) em Batatais, interior do Estado, onde há cerca de 15 alunos por sala. “Não quero que ele seja apenas um número na escola, quero que ele progrida”, diz a mãe.

As Apaes e outras entidades oferecem ensino até a 4.ª série e depois disso organizam aulas profissionalizantes, além do atendimento com psicólogos, fonoaudiólogos e outros profissionais da área de saúde.

Karen Cristina, de 16 anos, pediu e a mãe a tirou da escola regular e a levou de volta à Apae. “A professora chegou a dizer que ela não tinha condições de estudar lá”, diz a mãe, Maria Aparecida dos Santos. A menina tem dificuldade para se locomover e a escola exigia que uma irmã ficasse ao lado dela para ajudá-la. “Ela deixava de comer a merenda porque não tinha quem a levasse.”

A procuradora da República Engênia Fávero, autora da cartilha do Ministério Público Federal, diz que casos como esses devem ser denunciados. O que causou maior polêmica, no entanto, foi o trecho do texto que fala que os pais estão cometendo “crime de abandono intelectual” ao não matricular os filhos com deficiência na rede pública de ensino. “Não é que vamos sair mandando prender os pais, cada caso será analisado pelos promotores. Quem teve seu filho rejeitado na escola não será penalizado.”

Cerca de 60 mil cartilhas foram distribuídas para escolas do País. A intenção, segundo Eugênia, foi a de mostrar a legislação já existente sobre o assunto. “Nada é novo lá, o direito de todas as crianças à educação está na Constituição.”

A secretária de Educação Especial do MEC, Claudia Dutra, diz que a inclusão é debatida há décadas e as escolas têm se preparado. Entre 1998 e 2004, cresceu de 13% para 34% o porcentual de crianças com deficiências atendidas em classes comuns. São 195 mil dos 566 mil que estudam no País.

Ela cita ainda 55 mil professores capacitados entre 2003 e 2004 com esse propósito e um programa do ministério que está formando dirigentes de 106 cidades. “O projeto de inclusão não pode mais ser adiado por entender que as escolas não estão preparadas. A formação não é apenas o treinamento prévio, é preciso matricular a criança, estabelecer a relação professor-aluno e então perceber o que é necessário para que ela aprenda”, diz.

A rede pública de ensino brasileira, porém, convive com salas superlotadas, baixos salários, má formação dos professores, projetos pedagógicos ultrapassados e estrutura insuficiente. “Como você vai dar atenção a um aluno especial numa sala com 50 crianças?”, questiona o presidente do sindicato dos professores de São Paulo (Apeoesp), Carlos Ramiro.

Os defensores da inclusão total acreditam que a chegada dessas crianças vai pressionar a escola a entender que a educação moderna respeita o ritmo de aprendizagem de cada aluno, seja ele deficiente ou não.

A inclusão é um conceito defendido por educadores do mundo todo. Difícil encontrar quem se oponha à convivência de crianças com algum tipo de deficiência com outras de sua idade, tanto para o desenvolvimento social e educacional como para diminuir o preconceito. O presidente da Federação Nacional das Apaes, Luiz Alberto Silva, também não discorda. Diz que a instituição que preside encaminha cerca de 10 mil crianças por ano para escolas regulares, mas a inclusão não é para todos.

“Há casos graves de deficiência mental em que não se consegue saber qual é o nível de compreensão da criança”, diz. “Ao forçar a barra e com uma recepção inadequada na escola, muitas deixarão de estudar”, completa a vice-presidente da Associação de Assistência à Criança Deficiente (AACD), Ika Fleury.

Para a secretária, é preciso saber diferenciar a educação curricular, oferecida nas escolas comuns, da educação especializada. Dessa última fazem parte o ensino do braile, da língua brasileira de sinais ou mesmo o desenvolvimento cognitivo para deficientes mentais, o que deve continuar sendo oferecido pelas entidades, segundo ela.

Silva acusa o governo e o MPF de tentar acabar com as escolas especiais, que, segundo ele, prestam serviços essenciais para essa população. “Em municípios onde não estamos, há ainda deficientes amarrados ao pé da cama.” As instituições sem fins lucrativos e ONGs se mantêm também com dinheiro do governo. Só o MEC repassou, em 2004, R$ 51 milhões em ajuda de transporte escolar, merenda e livros didáticos, entre outros.

“A escola regular é o lugar onde as gerações se encontram e se relacionam, os que têm alguma deficiência também têm esse direito”, diz Claudia Werneck, fundadora da ONG Escola de Gente, que organiza projetos para jovens, empresas e outros grupos para difundir a inclusão. “Gerações e gerações de brasileiros são criadas para discriminar as pessoas em razão de suas diferenças. Isso tem de mudar.”